Vivenciar atividades de produção de leitura com alunos do ensino fundamental, cujas condições institucionais (ambiente oferecido pela escola) e sociais (condições de vida), nem sempre são adequadas, torna-se uma tarefa difícil de ser executada, principalmente se esta se prende apenas aos moldes do ensino tradicional. Como conseqüência, lamentavelmente, os alunos entram lendo o mundo em volta deles e saem sem nenhum estímulo para, por meio dos diversos gêneros textuais que circundam a nossa existência, conhecer e interagir com outros mundos, desenvolver competências leitoras.

Educação por projetos: desafio ao educador no novo milênio.



Educação por projetos: desafio ao educador no novo milênio.
Prof. MS. João Beauclair

Na prática pedagógica do PDHEC - Projeto Direitos Humanos, Educação e Cidadania , buscar a compreensão dos significados daquilo que os alunos vivenciam é tarefa fundamental. Em sua proposta, o projeto leva em consideração a formação dos alunos enquanto cidadãos participantes e pesquisadores sobre a vida social como um todo, procurando entender as diferentes maneiras que interpretam as ações dos seus próprios "eus" no espaço escolar que estão atuando, assim como também, no espaço da comunidade onde a escola está inserida, ou seja, no próprio meio onde vivem.
A cidadania juvenil é tema polêmico e extremamente complexo quando se trata de termos que encontrar uma definição que lhe dê cara e sentido. De um modo geral, experiências, vozes e histórias, através dos quais os estudantes vão dando sentido às suas próprias vidas, não são levadas em consideração no processo de ensino e aprendizagem.
Na verdade, a presença dos alunos na escola se reduzem a uma participação insossa, vinculados a um cotidiano onde o que se pretende é apenas fazer valer os processo de transmissão e imposição de um conhecimento estanque, distanciado da realidade e, principalmente, imposto pela cultura escolar vigente.
Tal cultura está impregnada de uma série de tradições que privilegiam determinados padrões de aprendizagem. A racionalidade, onde tudo precisa ser organizado, sintetizado, hierarquizado e explicado e o pensamento lógico-matemático, dedutivo, quantificável, seqüencial e demonstrável são padrões arraigados no cotidiano escolar de forma já cristalizadas que difícil se torna até mesmo identificá-los e compreendê-los.
Além disso, podemos notar que nessas tradições, os processos de aprendizagem passam pela disjunção e redução, ou seja, separam processos que necessariamente precisam ser analisados juntos em conjunto, como por exemplo, as relações corpo e mente, objeto e razão, espiritual e material, intuição e lógica recepção e emissão, entre outras. Convém lembrarmos também outras duas características presentes nas práticas escolares tradicionais.
A primeira está ligada essencialmente aos modelos dominantes de construção do conhecimento, onde delimitação, parâmetros e coerência são os focos centrais. A outra característica está relacionada aos procedimentos adotados, ou seja, o conhecimento é livresco, tratado como transmissão, através da exposição oral, da leitura linear, da repetição e da memorização.
De acordo com Freire, este modelo educacional é o que mais se identifica como prática de ensino e menos com a habilidade de efetivamente educar. Assim, os papéis são limitados cabe
ao professor o de ser o
"ser superior que ensina a ignorantes. Isto forma uma consciência bancária (sedentária, passiva). O aluno recebe passivamente os conhecimentos, tornando-se um depósito do educador. Educa-se para arquivar o que se deposita (...) A consciência bancária 'pensa que quanto mais se dá , mais se sabe' ".
No entanto, se percebermos o espaço escolar com sendo um espaçotempo de embates e lutas, e se acreditarmos que o fazer pedagógico é uma ação de política cultural, podemos defender a idéia de que tal espaço se constitui como lócus privilegiado para a ampliação das habilidades e capacidades humanas, de modo a contribuir para que os diferentes indivíduos que nela desempenham seus papéis sociais possam elaborar suas intervenções na formação de suas próprias cidadanias.
Além disso, acreditamos que, mesmo com as diferentes necessidades presentes no contexto educacional brasileiro atual, é possível criar condições para que surja o exercício pleno e ativo da crítica e da democracia.
Os desafios são muitos, principalmente no que se refere aos necessários processos de 'empoderamento' pelos quais se faz necessário passar educadores e educandos. Acreditamos
que estes processos podem ser de extrema valia se aliados a uma percepção de mudança nos processos comunicacionais existentes.
Ou seja, é preciso que a sala de aula, como espaçotempo privilegiado para a construção do conhecimento, conte com o jogo, com o acaso, com o aparentemente ilógico, faça valorizar o inesperado. Conte, ainda, com os diferentes aspectos de percepção dos sentidos, aproximando-se das múltiplas sensações, ou seja, onde as diferentes habilidades sensoriais possam interagir em dinâmicas onde coexistam centros múltiplos de conexões.
Neste sentido ganha espaço a prática pedagógica que esteja aberta à experimentação, à navegação, à simulação e à participação, processo que podem levar os educandos a exercerem a criatividade humana e a capacidade de ousarem.
Acreditamos que o necessário procedimento para a efetivação da prática pedagógica acima descrita é o de encontramos alternativas à modalidade comunicacional vigente, sendo preciso, para isso, transformar as concepções de ensino que petrificaram e cristalizaram a aprendizagem na torpe encenação unidirecional de imposição e transmissão curricular onde hábitos, valores e condutas simplesmente 'ajustam' indivíduos aos interesses do mercado econômico. Podemos apontar como possibilidade alternativa para o que até aqui estamos expondo a metodologia de educação por projetos.
Diante de nossa experiência prática, sabemos que tal metodologia pode permitir a articulação de diferentes disciplinas e a análise dos diferentes problemas e desafios impostos pela vida social, além de permitir também vivências que possam contribuir para a busca de concretas soluções para tais desafios e problemas.
Além disso, podemos associar tal metodologia as propostas de pedagogia crítica defendida por Henry Giroux Roger Simon, Peter McLaren e Michel W. Aplle.
Entre outras idéias e preocupações, tais autores defendem que a prática pedagógica deve agir com a intenção de se criar condições efetivas para a construção de experiências significativas na vida dos diferentes atores sociais envolvidos no processo pedagógico.
O trabalho com projetos permite a criação de tais condições, pois as possibilidades de autoria e de comunicação se abrem e o que efetivamente enriquece a prática pedagógica nesta metodologia é a presença ativa do aluno; eles fazem muito, se interessa vão além da mera captação das idéias centrais; eles são os autores de sua experiência e os seus feitos ganham vida e significado no espaçotempo escolar. Se observarmos que o ser humano aprende muito mais pela experimentação do mundo,  é claro que aprender experimentando, agindo, fazendo, é a maneira mais prazerosa, é uma estratégia de aprendizagem fundamental, é uma maneira de olhar realmente o indivíduo que aprende através da experimentação ativa do mundo, mediatizado pelo mundo.
Assim, uma educação por projetos deve procurar se interrogar sobre as maneiras que devemos trabalhar para a reconstrução da imaginação social em direção a utopia possível da liberdade humana.
As noções de justiça, diálogo, solidariedade, direitos humanos, pluralidade cultural, multiculturalismo, ética, democracia, dignidade humana, tolerância, entre outras, se fazem determinantes para a construção de um projeto de escola que busque ir além dos limites do cotidiano. Atuar com projetos é um acreditar na educação baseada na liberdade humana, onde o ensinar e o aprender fazem associação com a compreensão a ser buscada sobre por que as coisas são como são e, ainda, como elas vieram a se tornar o que realmente são.
Muitas são as perguntas, os questionamentos a serem feitos, mas apesar disso, vale refletirmos sobre a luta pedagógica que, no nosso cotidiano, travamos incessantemente. Segundo Simon e Giroux muito desta luta
"pedagógica consiste exatamente nisso: testar as formas pelas quais produzimos significados e representamos a nós mesmos, nossas relações com os outros e com o ambiente em que vivemos. Assim procedendo, fazemos uma avaliação do que nos tornamos e do que não mais desejamos ser. Também nos capacitamos a reconhecer as possibilidades não concretizadas e a lutar por elas."
Aqui não pretendemos aprofundarmos a temática. O que se considera fundamental é buscar sensibilizar o maior número possível de pessoas para a temática em pauta. Trabalhar com projetos pode aproximar comunicação e conhecimento efetivos, onde grupos de trabalhos se colocam em movimento e formam uma teia de co-criação entre os envolvidos na prática pedagógica.
Acreditamos que a própria busca e avaliação das diferentes informações acabam por criar o próprio conhecimento ampliando, assim, a própria comunicação. A nós, educadores, cabe a tarefa política de tentarmos disponibilizar diferentes modos de intervenção e participação dos nossos educandos, propondo projetos de trabalho, acompanhando o seu desenvolvimento das diferentes atividades e, ainda, mobilizar as múltiplas sinergias entre as diferentes habilidades e competências necessárias ao desenvolvimento de todo o trabalho.
Utopia.
Muitas vezes esta é a palavra que ouvimos quando propomos temas e atividades para o nosso PDHEC - Projeto Direitos Humanos, Educação e Cidadania. E ao ouvir tal palavra, refazemos nossas forças e seguimos caminhando, indo adiante, acreditando, com Eduardo Galeano, que ela serve para isso, para caminhar. Sabemos ainda que o 
"... ideal é o que está por vir. É o que se coloca a nossa frente. E, assim, afigura-se como algo utópico, não no sentido de impossível, de existir, mas daquilo que ainda não existe, que não está aqui e agora, mas que vamos nos esforçar por atingir e no qual vamos empenhar nossa esperança e nossa ação para realizar, tornar real”.
Neste sentido é importante ressaltar que, mesmo com os todos os anos envolvidos no desenvolvimento efetivo do PDHEC - Projeto Direitos Humanos, Educação e Cidadania, ainda percebemos o quanto ainda existe para se caminhar em direção à aquisição um terreno mais firme de propostas, recursos humanos e materiais para a ampliação de nossas atividades. Cabe-nos aqui refletir sobre os princípios defendidos por Ivani Fazenda, ao afirmar que para a interdisciplinaridade existem três idéias fundamentais: a espera, a cautela, a humildade. Assim, estamos indo ao encontro de um conjunto de saberes que se vão sendo feitos, articulados, construídos a partir de toda uma vivência onde educando e educadores buscam uma prática significativa no seu cotidiano.
Procurando superar os limites da realidade imposta, desnudar e desvelar os preconceitos, descobrindo novos caminhos, novas possibilidades, trabalhando e afirmando a diferença, a diversidade e reconhecendo a igualdade, estamos trilhando um caminho, uma senda, compreendendo nossas ações como um projeto em construção, onde
"se guarda o desafio de realizar a escavação do possível, de um diálogo de competências em busca de uma igualdade na diferença, isto é, uma exploração da diversidade fertilizada pela ética, por um esforço no sentido de afastar as tentações moralizantes ou cínicas e, humilde e corajosamente, ampliar o espaço humano no mundo em que vivemos.
Referencias:
O PDHEC - Projeto Direitos Humanos, Educação e Cidadania foi implementado em Cachoeiras de Macacu - RJ, em 1998 e na Escola Estadual Maria Veralba Ferraz desde 1999. Em 2000 passou a integrar o Programa Direitos Humanos na Escola, da organização não-governamental Novamerica, sediada no Rio de Janeiro. (www.novamerica.org.br) Em 2001 recebeu a Certificação do PEA-UNESCO- Programa de Escolas Associadas da UNESCO, e no final de 2002 deixou de ser efetivamente desenvolvido na escola em tela.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1978, p. 98.
FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1979, p.38.

Bibliografia:
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1978.

_______,_____. Educação e Mudança. Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1979.

MOREIRA, Antonio Flávio e SILVA, Tomaz Tadeu (org.) Currículo, Cultura e Sociedade. Editora Cortez, São Paulo, 1999.

FAZENDA, Ivani (org.) A pesquisa em educação e as transformações do conhecimento. Editora Papirus, São Paulo, 1997.

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